sexta-feira, 18 de dezembro de 2020

O fraco entendimento da economia

Está a tornar-se demasiado evidente que o governo não tem, nem sequer aproximadamente, a noção da hecatombe que está prestes a provocar na economia. Os ministros responsáveis parecem comportar-se como se acreditassem que, debelada ou controlada a pandemia, uma rápida retoma acontecerá. Mas não vai acontecer. Nem em V, nem em U, nem em qualquer outra forma simétrica. 

Destruir é muito mais fácil e rápido do que reconstruir, como todas as guerras provam, e esta não será excepção. Muitas empresas irão desaparecer para sempre, muitos empresários ficarão insolventes ou descapitalizados e incapazes de retomar actividade, muitos outros já não terão confiança ou ânimo ou idade para o fazer, e muitas das cadeias de produção e abastecimento que existiam irão romper-se ou enfraquecer. Como em qualquer cadeia alimentar no mundo animal, passe a analogia, também no mundo económico as perturbações nas cadeias de transmissão de bens e serviços se repercutem a montante e a jusante.

De facto, é perigoso julgar que restrições prolongadas impostas a qualquer sector não irão provocar-lhe danos potencialmente irreversíveis ou que irão afectá-lo só a ele. E não é apenas por causa do risco de falências e despedimentos em massa. A descapitalização das empresas tem geralmente efeitos negativos duradouros no investimento e no emprego, e desse modo acaba por repercutir-se em várias direcções.

Quando um sector económico entra em declínio, ele põe também em xeque toda a sua cadeia de fornecedores, a não ser que isso seja compensado por outros sectores em expansão. E se não for? E se houver vários outros sectores em declínio mais ou menos simultâneo? Ao gerar menos rendimento (em lucros, dividendos e salários), esta conjunção negativa também irá induzir menos despesa, reduzindo outros fluxos económicos e pressionando no sentido da deflação (uma perigosa baixa generalizada de preços, por insuficiência da procura). Para além de certos limites, a forte contracção económica pode até desencadear um efeito “bola de neve”, provocando uma recessão ainda mais severa ou mesmo uma depressão.

Ora, com uma pandemia em curso, o cenário já era terrivelmente negativo à partida, apenas com a redução da mobilidade e do turismo e com o confinamento voluntário de muitas pessoas. Num tal pano de fundo, decisões políticas desastradas podem vir a ser fatais para muitos empregos, empresas e áreas de negócio, para já não falar da dramática perda de receitas fiscais pelo próprio Estado (outro pesadelo cujas consequências se irão também abater em breve sobre os contribuintes e os serviços públicos).

Poucos são os políticos que compreendem o “efeito multiplicador” das decisões que tomam sobre a economia. Quando são efectuadas despesas pelos agentes económicos, elas geram rendimentos que vão sustentar outras despesas por parte de quem os auferiu, e assim sucessivamente. Portanto, cada euro gasto gera muito mais do que isso em actividade económica. Mas quando as coisas sucedem ao contrário e os rendimentos se contraem, passando a sustentar menos despesas de investimento ou de consumo, o “efeito multiplicador” também actua, mas em sentido inverso (por isso, há economistas que preferem chamar-lhe “efeito desmultiplicador”, o que talvez seja mais apropriado). Em tais circunstâncias, cada euro gasto a menos reduz em muito mais do que isso a actividade económica, o que, em larga escala, pode ter graves consequências. Por conseguinte, quando as decisões políticas fazem contrair ainda mais os rendimentos e as despesas em ambiente de recessão, nunca se sabe ao certo onde e quando esta irá parar mas o prognóstico não é risonho.

Uma quase imediata recessão veio naturalmente em consequência da pandemia. Desde o início dela se percebeu que iria afectar gravemente a economia, mesmo sem quaisquer decisões do governo. Mas muitas das que têm sido tomadas, umas por necessidade, outras por improviso, outras por desnorte, tendem a reforçar bastante a tendência recessiva. Em breve saberemos aonde este declive acentuado nos irá levar, mas preparem-se para algo desagradável.

Entretanto, seria bom que alguém conseguisse explicar ao governo quão perigoso é continuar a pressionar tanto com o joelho o já debilitado pescoço da economia…

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